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MICROEMPREENDEDORES INDIVIDUAIS PODERÃO SER AFETADOS POR REFORMA DA PREVIDÊNCIA

Fonte: Previdência Total
Colaborador: Thiago Luchin

Trabalhar com carteira assinada ou no serviço público não são as únicas opções para poder contar com uma aposentadoria pública após décadas de trabalho. A opção de trabalhar como um Microempreendedor Individual (MEI) cada vez mais é frequente no país em meio à recessão econômica, à tentativa de montar o seu próprio negócio e à preferência e a necessidade de empresas de fugirem de encargos trabalhistas. De acordo com dados do Portal do Empreendedor, no final de março, o número de MEIs no país passava dos 8 milhões.

É possível que o microempreendedor individual contribua para a previdência e se aposente pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Contudo, é necessário que haja organização financeira em meio a outros desafios de empreender e mesmo o MEI deve ser afetado pela possível reforma da Previdência. Especialistas explicam como o microempreendedor individual no país pode contribuir para o INSS, os problemas dessa modalidade de trabalho e o que leva os trabalhadores a optarem ou a utilizarem esse modelo.

De acordo com Rafael Serrano, especialista em Direito Previdenciário e sócio do escritório Chamon Santana Advogados, o microempreendedor individual recolhe suas contribuições por meio de uma única guia mensal, o chamado Documento de Arrecadação do Simples Nacional (DAS). Nele, está inclusa a contribuição previdenciária para o INSS, assim como o Imposto sobre Serviços (ISS) e o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). O valor da guia corresponde a 5% do valor do salário mínimo (R$ 998), o que atualmente corresponde a R$ 49,90.

“A contribuição regular permite que o microempreendedor esteja coberto por vários benefícios, como o auxílio-doença, a aposentadoria por idade, aposentadoria por invalidez e salário maternidade, assim como pensão por morte e auxilio reclusão concedidos à sua família”, explica o especialista.

O governo mantém o site Portal do Empreendedor onde é possível encontrar os procedimentos a serem cumpridos e fazer o download da DAS, segundo Serrano. Caso se deixe de efetuar o pagamento do boleto mensal no vencimento, é necessário gerar uma nova guia no site para o pagamento em atraso. Há uma multa de 0,33% por dia de atraso limitada a 20% e juros que são calculados com base na taxa Selic.

Leandro Madureira, especialista em Direito Previdenciário e sócio do escritório Mauro Menezes & Advogados, destaca ainda que a contribuição previdenciária do microempreendedor individual é diferenciada em relação a dos demais segurados. “Enquanto os segurados empregados contribuem com um percentual de 11% sobre o salário de contribuição, o percentual aplicado aos microempreendedores individuais é de 5% sobre o salário mínimo vigente”, explica.

Para o especialista, a redução de percentual se justifica ante a necessidade do Estado em promover a proteção social aos trabalhadores que, embora exerçam uma atividade profissional, são considerados informais. “Assim, o trabalhador que trabalha por conta própria e possui um pequeno negócio pode participar do sistema previdenciário”, afirma.

Reforma da Previdência

Outra dúvida que pode surgir entre os microempreendedores, além da forma de efetuar a sua contribuição previdenciária, é como o seu futuro pode ser afetado com a possibilidade de aprovação de uma reforma da Previdência.

O governo federal apresentou no final de fevereiro a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 06/2019, que altera as regras do sistema previdenciário e está atualmente em discussão na Câmara dos Deputados.

Segundo Erick Magalhães, especialista em Direito Previdenciário e sócio do escritório Magalhães & Moreno Advogados, o projeto apresentado pelo Governo Bolsonaro não altera a alíquota de 5% de recolhimento para o MEI sob o seu salário. Contudo, afeta diretamente seus direitos, assim como para os demais segurados. “Isto porque, atualmente, a aposentadoria por idade exige 180 contribuições e 60 e 65 anos de idade para as mulheres e homens, respectivamente. Já com a reforma será exigida o mínimo de 20 anos de contribuição, além de também alterar a idade que passará a ser de 62 anos para mulheres e 65 anos para os homens”, analisa.

Para o advogado Leandro Madureira, ninguém poderá escapar das mudanças do sistema previdenciário, caso aprovadas, e as alterações estimulam com que parte dos trabalhadores passem a não contar com a ideia de conseguirem receber uma aposentadoria pública. “Quando se exige que esse empreendedor passe a contribuir por um período maior para fazer jus a uma aposentadoria por idade, a reforma afeta a todos os cidadãos. Afetará a todos aqueles que já fazem parte do sistema previdenciário e tende a fomentar o aumento do mercado informal. Qual trabalhador irá se vincular ao INSS, mesmo com uma contribuição pequena, se os benefícios ficam cada vez mais difíceis de serem alcançados?”, questiona.

De acordo com o economista e diretor-executivo da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), Miguel Ribeiro, o baixo valor da aposentaria pelo INSS leva a trabalhadores a buscarem outras formas de complementação da renda. “Possivelmente, a hora que se aposentar, vai receber um valor pequeno. Seria necessário complementar com uma renda variável, uma previdência privada, muita gente faz isso”, afirma.

Entretanto, para o especialista em Direito Previdenciário e sócio do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados, Thiago Luchin, os trabalhadores devem insistir no direito de contar com uma previdência pública após anos de trabalho. “Independentemente dos problemas e o marketing negativo que o governo está fazendo sobre a Previdência, é fundamental para o microempreendedor regularizar a sua situação e se vincular à Previdência Social. Só assim terá a garantia de receber um benefício se precisar ou de se aposentar no futuro”, defende.

Escolha ou imposição

Atualmente, na visão de especialistas, trabalhar no país como microempreendedor individual pode ser mais uma imposição do mercado do que uma escolha consciente. É o que opina Dora Ramos, orientadora financeira e fundadora da Fharos Contabilidade. “O mercado, cada vez mais, vem colocando que a contratação é por meio de um CNPJ. Então, o que era a princípio uma maneira de dar condições para que pessoas mais simples pudessem contribuir e ter um respaldo do INSS, acabou virando uma alternativa para um número maior de profissionais, que poderiam estar empregados como CLT e agora são MEI”, analisa.

Na visão do economista e professor de ciências econômicas da Universidade Federal do ABC (UFABC), Ramon Fernandez, trabalhar como MEI é hoje uma exigência por conta das condições desiguais entre trabalhadores e empregadores. “O empregado tem muito mais a perder do que o empregador, especialmente em uma época de desemprego recorde. Nesse sentido, contratar um indivíduo como MEI reduz os encargos para as firmas quando comparado com a situação de um empregado com carteira assinada. É uma exigência de muitas empresas para aceitarem o trabalhador”, explica.

De acordo com o economista, muitos microempreendedores atuam como empregados para empresas, ao invés de terem o seu negócio próprio, mas não tem a sua situação real reconhecida. “Logo, afirmar que isso é uma escolha é um eufemismo, é a escolha de entregar a carteira para o indivíduo que solicita isso gentilmente apontando uma arma para você”, critica.

A orientadora Dora Ramos afirma que é importante lembrar que um dos objetivos da criação do MEI foi formalizar a situação de trabalhadores que não contribuíam com a Previdência e, assim, possibilitar o incremento dessas arrecadações.

Para ela, a lei da terceirização (Lei nº 13.429), aprovada em 2017 e que permitiu que qualquer atividade no país fosse terceirizada, não visava impactar diretamente o sistema previdenciário. Mas o que ocorreu, na prática, é que houve uma tendência de migração de parte dos trabalhadores que eram contratados pelo regime da CLT para outros regimes em que a contribuição para a Previdência é apurada de maneira diversa. “Especificamente no caso da migração para o MEI, como a contribuição previdenciária devida pelo trabalhador e pelo contratante ao sistema previdenciário são bastante reduzidas, esse movimento tende a gerar uma redução da arrecadação para a Previdência”, alerta.

A especialista lembra ainda que, entretanto, a legislação veda que os empregadores dispensem seus empregados para contratá-los como pessoa física ou como MEI com o objetivo de economizar gastos trabalhistas e previdenciários.

Na visão do advogado previdenciário Erick Magalhães, o MEI gera um impacto positivo no sistema previdenciário, quer do ponto vista social, quer do ponto de vista econômico, já que gera arrecadação e protege o trabalhador. Contudo, de fato, é comum que as empresas contratem a figura de um empregado na condição de terceirizado. “Esse cenário termina por impactar negativamente a Previdência, tanto pela redução de arrecadação, quanto pelo aumento de gastos da máquina pública em razão da doença ou acidente desse terceirizado”, analisa.

O MEI no Brasil

Erick Magalhães explica que, de acordo com a Lei Complementar n. 123/2006, considera-se MEI o empresário individual ou o empreendedor no país que exerça as atividades de industrialização, comercialização e prestação de serviços no âmbito rural e que tenha auferido receita bruta de R$ 81 mil no ano-calendário anterior. Ele também não pode participar de outra empresa como titular, sócio ou administrador, deve ter um único estabelecimento e não ter mais do que um empregado.

Conforme os números do Portal do Empreendedor relativos ao mês de março, a maioria dos microempreendedores atuam como cabeleireiros, manicures e pedicures (66.937), profissionais da área de vestuário (641.346), de obras de alvenaria (358.053), de promoção de vendas (210.669) e de alimentação (218.946).

A maioria desses tipos de trabalhadores tem entre 31 e 40 anos, parcela que soma mais de 2,5 milhões.

Para a orientadora financeira Dora Ramos, é importante que o microempreendor individual se preocupe em ter um faturamento suficiente para que possa de fato pagar a si mesmo um salário mais alto e fazer um pagamento complementar do INSS.

Na visão da especialista, o MEI tem se tornado cada vez mais o “time da frente” de diversas empresas quando atua como um empregado. “É aquele que está ali fazendo a base da empresa, sem os direitos que ainda existem para os trabalhadores. Isso, por um lado, ajuda a empresa em uma economia, pois os encargos são bastante altos. Por outro, deveria ter para o microempreendedor uma educação financeira, pois ele acaba ficando desorientado. A educação financeira não é da nossa cultura”, analisa.

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